As minhas memórias, a minha essência (T1 Ep.14-6)
Passamos
a tarde a rever várias partes do projecto e as ideias que queria introduzir. Esta
era eu, esta era a minha paixão. A natureza do meu ser ansiava por estes
momentos passados no quarto de costura.
Anoiteceu
rápido e antes do jantar a Joan foi embora. O véu não estava completamente
levantado, mas sentia-a mais próxima, com menos receios em se abrir comigo. No
seu olhar já não via o medo de ser incompreendida.
Depois
de jantar, ajudei a organizar a cozinha para os afazeres de amanhã e fui até ao
meu quarto. Tinha muito que escrever. Precisava de desabafar e através da
escrita conseguia o fazer. Aqui libertava todas as minhas questões, os meus
receios, os meus desejos mais profundos, os meus sonhos. Este pequeno caderno
continha a minha verdadeira essência. Este era o meu leal amigo. Recebia todos
os meus pedidos, abraçava todos os meus medos sem me criticar, sem me julgar.
Aceitando-me tal como sou.
E
agora com muito mais sentido escrevia, pois em mim residia a vontade de deixar
o meu testemunho. Queria criar uma cápsula do tempo, como fazia com as meninas
a cada passagem de ano! Se estava destina a regressar a este mundo, eu seria a
pessoa mais indicada para me trazer de volta. Sem magia, sem mentiras, sem
confusão. Aceitar a dor, vive-la e ultrapassa-la. A realidade do testemunho
contado pela única pessoa que eu jamais poria em causa, pois sei que por razão
alguma me mentiria… Eu!
Enquanto
escrevia ele estava no meu pensamento, queria vê-lo, sentir a sua presença. Desafogar
a sua solidão. Imaginar alguém preso a este mundo, sendo obrigado a preservar a
sua imagem, mantendo-se oculto porque jamais a sua aparência mudará, se descoberto
o que o esperaria seria a incompreensão, o medo… tendo o seu coração despedaçado
a cada partida dos seus entes e ter de o reviver uma e outra vez… a mera ideia
de tal sofrimento, enchia-me de compaixão. Passar por esta prisão quebraria a
alma mais pura. Viver na esperança de voltar para os braços da sua amada e por
mil anos esperar…
De
repente, um barulho na minha janela. Soava a pequenas pedras! Fui espreitar… E
lá estava ele entre os arbustos do jardim junto ao quiosque.
Fez-me
sinal para descer e assim o fiz. Sorria por dentro de felicidade. Ele estava a
um passo de distância.
Com
alguma cautela desci as escadas. Tanto a sala como a cozinha estavam vazias.
Abri a porta da cozinha e para ele segui…
Rose:
Podias usar a porta da frente, sabias?!
Seth:
Desculpa vir assim e sem avisar… Esqueceste-te da tua écharpe no gazebo ontem.
Huh… Pode fazer-te falta. – O seu embaraço era amoroso.
Rose:
Obrigado! Guardaste-a até agora?
Seth:
Sim! Eu mandei mensagem à Rebecca… Mas ela não me respondeu.
Rose:
A Joan saiu daqui à pouco… - Não tive intenção de o corrigir. É tudo muito
estranho. Ele pertence a uma realidade que não é a minha. – Está um pouco frio
cá fora, queres entrar?
Seth:
Não, é melhor não.
Rose:
Não tens de te esconder. Aqui estás seguro.
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